Diante de tantas questões acerca da autorização em se pôr a falar e escrever sobre a transmissão em psicanálise, nos deparamos com os percalços de sustentar os nossos desejos e de uma prática que pressupõe um sujeito de desejo. Mas afinal, o que isso quer dizer? O que seria um sujeito de desejo ou o desejo em si?
Numa tentativa de explicação, possivelmente falível, uma vez que, falar do próprio desejo é, no mínimo, complexo, exporemos uma metáfora acerca daquilo que concerne um dos caminhos do desejo que nos pulsa, já que ele é sempre inapreensível. Uma de nós (somos 3 a escrever), estava percorrendo o trajeto de sua casa até seu consultório, divagando justamente sobre os caminhos que fizera e as razões pelas quais escolheu, como lugar, a cidade de Cascavel/PR.
Ouroboros (ou oroboro ou ainda uróboro) é um conceito representado pelo símbolo de uma serpente, ou um dragão, que morde a própria cauda. O nome vem do grego antigo: οὐρά (oura) significa “cauda” e βόρος (boros), que significa “devora”. Assim, a palavra designa “aquele que devora a própria cauda”. Sua representação simboliza a eternidade.
Ao narrar sobre seu percurso, outros questionamentos lhe vieram à mente: O que é um percurso? O que mais importa; o caminho ou o seu fim? O fim ou sua finalidade?
Esses questionamentos realçam a importância de falarmos e de nos implicarmos nos caminhos que escolhemos. Poder falar sobre nossas conquistas e desgraças, sobre aquele mal-estar que nos acomete toda vez que nos propormos a realizar algo ou até mesmo de fazer brotar disposição apesar de um dia intenso de afazeres. Nos dispormos a falar sobre o querer e o não querer para, posteriormente, permitirmo-nos reconhecer o que realmente desejamos. Assim, torna-se possível advir um sujeito para que esse possa, aos poucos, aceitar suas impossibilidades e que essas não sejam vistas como incapacidades, pelo contrário, é o não-poder tudo que nos permite poder algo.
Não por acaso, desejo não equivale à vontade, ele pode ser comparado a uma sala de espera, pois precisamos nos propor a estar lá (no entre) para que as possibilidades se revelem. Todavia, mesmo após realizada uma das escolhas, não haverá garantias de satisfação e plenitude ou, sequer, de respostas, o que haverá são outras novas (talvez nem tão novas assim) possibilidades, ou seja, o percurso desejante não é o fim, mas a via de acesso a uma cadeia espiral e dinâmica de desejo. Em vista disso, ou seja, por uma questão de desejo, escolhemos por reconstruir nossos espaços de escuta, na mesma cidade, por razões singulares, mas convergentes, em alguns pontos.
Em virtude do desejo de se pôr a falar, através da escrita, sobre os caminhos que optamos, a pergunta sobre seu começo circula, sem ponto de partida ou ponto de chegada, tal como o percurso desejante do sujeito. Já diria Galeano (2015): “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos e ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Para que eu não deixe de caminhar”.
Cada uma, atravessada pelas suas histórias, seus sintomas, suas angústias, seus (des) encontros e com suas próprias questões deparam-se com esse estranhamento, tão familiar, que é se fazer desejante, cuja tarefa é tão peculiar.
Afinal, o que nos une, o acaso ou o desejo? Por que a psicanálise? Por que Cascavel?
Escrito por:
Cheila Rotta Scheibel
Izabele Zasso
Juliane Ozelame Ribas Mohana
Apoio Clínica Integrada.
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REFERÊNCIAS:
GALEANO, Eduardo. Para que serve a utopia. Blog Conti Outra. Disponível em:< http://www. contioutra. com/para-que-serve-utopia-eduardo-galeano>. Acesso, v. 28, 2015.
[1] Ensaio produzido a partir de questões da prática psicanalítica em consultório, bem como, de questões pessoais comuns.
[2] Psicanalista de abordagem Freud-Lacaniana.
[3] Psicanalista de abordagem Freud-Lacaniana e Mestre em Direitos Humanos.
[4] Psicanalista em formação de abordagem Freud-Lacaniana.